Julho Verde 2022 - Vera Cavalcanti: Tive câncer de laringe: rouquidão e tosse fizeram eu procurar logo um médico
Eu me chamo Vera Cavalcanti e tenho 67 anos. Me considero uma pessoa feliz e procuro sempre ser agregadora nas minhas relações. Quando tinha 41, passei por um momento difícil, a morte do meu marido. Foi um desafio enorme cuidar dos meus três filhos, mas esse período de incertezas foi superado. Hoje são todos casados e me proporcionaram a experiência de ser avó: tenho seis netos, que me ajudam até no meu trabalho de confecção de fantasias infantis.
Quando eu estava com 56 anos, descobri um câncer de laringe. O diagnóstico foi uma grande surpresa, mas as coisas vão se encaixando e eu contei com uma rede de apoio muito importante durante todo o tratamento, acobertada de todos os mimos que um paciente com câncer precisa.
Hoje sou muito grata aos médicos e a todos os profissionais que cuidaram de mim. O tratamento do câncer foi um período marcante e me deu a certeza de que eu sou muito amada e que ainda quero viver muito tempo para poder contar histórias como essa.
Os sinais que alertaram
Minha voz sempre foi um pouco rouca, mas comecei a perceber que parecia que tinha um pigarro, uma secreção na garganta. Eu moro sozinha e um dia minha irmã veio dormir aqui em casa e disse que eu roncava muito e parecia até que era uma apneia.
Procurei um otorrinolaringologista e ele pediu que eu fizesse alguns exames, como a laringoscopia [exame que traz uma visão detalhada da laringe e da garganta] e polissonografia [exame que avalia qualidade do sono]. O médico me disse que eu estava com um refluxo e passou medicamentos também para rinite. Até então eu nunca havia tido nada disso.
Uns sete meses depois, estava em uma reunião familiar e na volta para casa tive uma hemoptise (tosse com sangue). Fiquei desesperada, porque na hora lembrei do meu pai que faleceu com câncer de pulmão e o primeiro sinal foi esse também.
Fui direto para a emergência do hospital mais próximo. A médica achou melhor me internar naquela noite para investigar a causa daquele sintoma, mas eu não quis ficar ali, queria ir para um hospital que já conhecesse. Então, a médica preparou um relatório com todas as informações sobre o meu caso. Fiquei tão agoniada que nem li o relatório, apenas perguntei se era uma tuberculose. Eu já estava há 11 anos sem fumar e 15 anos sem beber nada de álcool.
Quando cheguei no outro hospital, acompanhada de minha cunhada e minha irmã, o otorrinolaringologista que me atendeu também pediu a minha internação. No outro dia pela manhã já fiz uma biópsia. Nesta hora me deu um branco porque tomei anestesia geral. Só lembro quando acordei, o médico me dizendo que o exame confirmou o diagnóstico de um câncer de laringe.
A força para lidar com a notícia
Quando acabou a recuperação da anestesia, voltei para o quarto. Lá estavam meus filhos, noras e todo mundo chorando. Senti como se estivessem no meu velório, então pedi para eles irem embora para não me sentir mal. Dei uma cochilada e, quando acordei, já estava com uma equipe multidisciplinar me atendendo. Em nenhum momento eu pensei em morte. Fiquei apreensiva no começo em passar por cirurgia ou perder os cabelos apenas.
Apesar de todos da família terem ficado preocupados, eu não estava sentenciada dentro de mim. Eu tinha 56 anos na época e decidi, diferentemente da opinião dos meus filhos, que não iria operar. Alguns dias depois já comecei a quimioterapia e a radioterapia.
O dia a dia do tratamento
O meu tratamento combinou a quimioterapia e a radioterapia. Esse processo durou cerca de 8 meses. Estava muito otimista e com muita coragem. Na segunda ou terceira sessão de quimio, o que eu havia imaginado aconteceu, já estava sem cabelo, mas não usei peruca e nem lenço. Assumi o meu novo visual. Algumas semanas depois comecei a fazer radioterapia. Foram mais de 30 sessões.
Tive medo em alguns momentos, principalmente quando ia para a quimioterapia. Mas logo esse medo passava. Depois da 25ª sessão de radioterapia, precisei passar por uma gastrostomia, porque fiquei sem saliva e minha garganta parecia ter queimado. Apesar de tudo, sempre levei com muita leveza.
Hoje sou muito grata aos médicos, que até viraram meus amigos. A rede de apoio que eu tive também foi muito importante. Fui acobertada de todos os mimos que uma pessoa nessa situação precisa, até porque tive várias reações.
A importância da equipe multidisciplinar
Eu tinha ao meu dispor uma clínica inteira: psicóloga, oncologista clínico, médico de cabeça e pescoço, radioterapeuta, técnicos, endocrinologista (porque eu tenho hipotireoidite de Hashimoto), equipe de enfermagem, auxiliares, recepcionistas, uma equipe incrível. Eu me senti em todo o tempo paparicada.
Histórico familiar
Eu perdi um irmão mais novo do que eu para o câncer. No dia que recebi alta do meu tratamento, o meu irmão avisou que um médico pediu para ele ir para Salvador e investigar um possível cálculo renal. Mas após o resultado da biópsia, descobriu que ele tinha um tumor raro, de ureter, de difícil diagnóstico e que já estava em metástase [quando se espalha para outras partes do corpo].
Além do meu pai, com câncer de pulmão, também perdi um tio com a doença no estômago. Mas também já tivemos vitórias, como a da minha neta, que na época tinha 15 anos, e da minha nora.
O retorno para o trabalho e família
Terminei o tratamento da radioterapia e aos poucos voltei para a casa e para minha rotina. Na época eu trabalhava, mas como estava perto dos 60 anos, pedi a aposentadoria. Quando meu neto nasceu, passei a fazer fantasias infantis. Faço tudo bem diferenciado, pois sei que as clientes gostam de coisas exclusivas e, ao mesmo tempo, é bom para a criançada se divertir.
Gosto de passear e ir ao shopping e sempre passo tempo com meus filhos e netos. Hoje eu me sinto como uma fonte de união da minha família.
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