Um estudo com 95 pacientes diagnosticados com câncer de glândula salivar de alto grau (SGC) e perfil HER-2 mostra que o uso de trastuzumabe adjuvante (inibidor de HER-2 após a cirurgia) aumenta exponencialmente o tempo de sobrevida do paciente quando comparado com aqueles que não recebem esta terapia. A conclusão é de pesquisadores do Dana-Farber Cancer Institute, Brigham and Women´s Hospital, em Boston, nos Estados Unidos e BC Center, em Vancouver, no Canadá, no estudo The Benefits of Adjuvant Trastuzumab for HER-2-Positive Salivary Gland Cancers, publicado na revista científica The Oncologist.
Na amostra, obtida retrospectivamente (pacientes tratados de 2002 a 2019), observou-se que aqueles que expressam HER-2, quando tratados com trastuzumabe, viveram em média por 74 meses após o tratamento em primeira linha, enquanto os que não receberam a terapia viveram em média 43 meses. Dos 95 pacientes incluídos, a maioria tinha doenças de alto grau, com carcinoma do ducto salivar como o diagnóstico mais frequente.
Ao comentar o estudo para o GBCP, a oncologista clínica do Hospital de Clínicas de Passo Fundo, Dra. Julia Pastorello, destaca que o diferencial da pesquisa foi demonstrar o provável benefício no tratamento anti HER-2 com trastuzumabe adjuvante associado a quimioterapia baseada em carboplatina e taxano para pacientes com câncer de glândula salivar de alto grau (SGC), com taxa de benefício acima de 50%. “Mesmo com dados retrospectivos, o estudo fornece uma visão detalhada dos resultados do tratamento de um subtipo considerado muito raro de câncer de cabeça e pescoço e para o qual a literatura ainda é escassa nesse contexto”, ressalta Dra. Julia Pastorello.
Os resultados apontam também que 35 pacientes (37% da amostra) apresentaram recorrência (volta da doença). Nove de 17 (53%) pacientes com carcinoma do ducto salivar HER-2 positivo receberam quimiorradiação adjuvante com trastuzumabe. O trabalho evidencia que, além das terapias dirigidas por HER-2, a privação de andrógeno também resultou em benefício clínico além do cenário metastático de primeira linha, com resposta parcial observada já a partir do uso de segunda linha.
O que motivou o estudo?
O câncer de glândula salivar (SGC) é um grupo heterogêneo de tumores distintos, extremamente raro, e desafiador em seu perfil histológico e molecular. Somado a isso, tem comportamento clínico variável. O tratamento padrão costuma ser de cirurgia com intenção curativa, seguida por radioterapia adjuvante, dependendo das margens de retirada do tumor, assim como características histológicas e envolvimento linfonodal (número de linfonodos comprometidos).
Porém, o papel da quimioterapia é incerto, tanto no contexto adjuvante quanto no quadro recorrente, incurável ou metastático. A principal motivação dos autores é o fato que, do ponto de vista molecular, novos alvos terapêuticos vêm demonstrando relevância clínica, sendo os mais promissores a terapia de privação de androgênio (ADT) e terapias direcionadas ao oncogene HER-2, que já demonstraram eficácia terapêutica conhecida em câncer de próstata, estômago e mama. Partindo dessa premissa, se investigou a eficácia em câncer de glândula salivar.
Embora os benefícios tenham sido observados neste tipo de câncer, a principal ressalva, afirma Julia, é que cerca de 25% dos pacientes com SGCs de alto grau apresentam recorrências tardias. Portanto, se faz necessário, aponta Dra. Julia Pastorello, acompanhar os pacientes por um tempo superior aos habituais cinco anos.
Referência do estudo
Hanna GJ, Bae JE, Lorch JH, Haddad RI, Jo VY, Schoenfeld JD, Margalit DN, Tishler RB, Goguen LA, Annino DJ Jr, Chau NG. The Benefits of Adjuvant Trastuzumab for HER-2-Positive Salivary Gland Cancers. Oncologist. 2020 Jul;25(7):598-608.
Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7356716/pdf/ONCO-25-598.pdf