Estudo publicado na revista científica The Lancet Oncology avalia a eficácia da combinação de cetuximabe, docetaxel e cisplatina em comparação com platina, flurouracil e cetuximabe como tratamento de primeira linha para pacientes com câncer de cabeça e pescoço de células escamosas, recorrente ou metastático (GORTEC 2014-01 TPExtreme). Multicêntrico, aberto, randomizado e de fase 2, o trabalho reuniu 541 pacientes. A conclusão é que o regime TPEx pode ser uma abordagem de primeira linha para este grupo de pacientes, especialmente para aqueles que podem não ser bons candidatos para o tratamento inicial com pembrolizumabe.
Considerando esses resultados, um artigo de comentário também publicado na The Lancet Oncology por Michael Hwang e Taguy Seiwert, ambos do Departamento de Oncologia da Johns Hopkins University, traz uma análise sobre o atual arsenal utilizado no tratamento para pacientes com câncer de cabeça e pescoço, incluindo o convencional uso de taxanos e a eficácia com as terapias multimodais e imunoterapia. O artigo busca responder à pergunta: are taxanes the future for head and neck cancer? / os taxanos são o futuro para o câncer de cabeça e pescoço?
Em busca da resposta, o primeiro questionamento trazido pelos autores é referente ao regime EXTREME, que ganhou visibilidade após artigo publicado em 2008. Ele consiste em protocolo de seis ciclos de fluorouracil (5-FU) infusional, platina e cetuximabe, seguido de manutenção semanal com cetuximabe. Foi o primeiro estudo em décadas a mostrar um benefício de sobrevida global em câncer de cabeça e pescoço metastático.
No entanto, recorda o oncologista clínico e secretário geral do GBCP, Dr. William Nassib William Junior, várias dúvidas surgiram à época da publicação, incluindo a necessidade de uso de platina e 5-FU como as drogas quimioterápicas básicas a serem combinadas com cetuximabe e a necessidade de se usar cetuximabe combinado à quimioterapia de primeira linha em comparação com a terapia de maneira sequencial (ou seja, imediatamente após a falha do esquema baseado em platina usado na primeira linha).
“O reflexo disso foi que oncologistas, já desde os primórdios da aprovação do regime EXTREME, substituíram o 5-FU por um taxano ou usavam platina e taxano combinados na primeira linha e reservavam o uso de cetuximabe para a segunda linha. Essas adaptações eram justificadas, em grande parte, pelo potencial de toxicidade e complicações logísticas relacionadas a 5-FU infusional, sendo assim adotadas desde a aprovação inicial do regime EXTREME”, ressalta Dr. William Junior, diretor médico de Oncologia e Hematologia da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Com otimismo, do pulmão para Cabeça e Pescoço
Entre as notícias com potencial de serem positivas está o estudo KEYNOTE-407, que mostrou com pacientes com câncer de pulmão de células escamosas uma sinergia entre taxanos e imunoterapia. Este trabalho, observa William Junior, consagrou o uso de quimioimunoterapia com platina, paclitaxel e pembrolizumabe para câncer de pulmão escamoso metastático virgem de tratamento. Segundo a análise do especialista, os dados robustos de ganho de sobrevida sugeriam que essa combinação poderia ter alta atividade não somente para câncer de pulmão, como também para outros cânceres do tipo escamoso (ou mesmo de outras histologias) de origem extrapulmonar, abrindo assim uma janela de oportunidade para pesquisas com câncer de cabeça e pescoço.
Um freio no otimismo
Ao contrário do estudo KEYNOTE-407, o KEYNOTE-048 freia o otimismo em relação ao impacto da interação entre taxanos e imunoterapia, embora não exclua que essa linha de investigação deva ser o futuro dos ensaios clínicos também em câncer de cabeça e pescoço. Dr. William Junior explica que nesse protocolo foi necessário o uso de platina e 5-FU como quimioterapia básica em combinação com pembrolizumabe. Isso, segundo ele, devido aos dados históricos do estudo EXTREME e às exigências feitas pelas agências regulatórias.
“Muitos oncologistas têm um entusiasmo menor pelo uso da combinação de platina, 5-FU, e pembrolizumabe justamente pelo potencial de toxicidade do 5-FU (e ausência de dados de que essa quimioterapia seria a mais adequada para uso em câncer de cabeça e pescoço). Na realidade, muitos serviços já adotaram o uso de platina, taxano e pembrolizumabe como tratamento padrão para câncer de cabeça e pescoço, em extrapolação aos dados de câncer de pulmão (KEYNOTE-407) e a todos os dados históricos que demonstram que um taxano é tão eficaz quanto (e menos tóxico que) 5-FU para câncer de cabeça e pescoço”, detalha Dr. William Junior.
Concluindo a análise que faz sobre o comentário publicado pelos pesquisadores da Johns Hopkins na Lancet Oncology, o oncologista clínico William Junior observa que os autores reforçam o conceito, já adotado por muitos e desejado por tantos outros, de que a combinação platina e taxano deveria substituir platina e 5-FU como o regime citotóxico de base a ser usado na prática clínica diária e em estudos futuros de novas combinações para câncer de cabeça e pescoço metastático.
Referências dos estudos
Guigay J, Aupérin A, Fayette J, Saada-Bouzid E, Lafond C, Taberna M, Geoffrois L, Martin L, Capitain O, Cupissol D, Castanie H, Vansteene D, Schafhausen P, Johnson A, Even C, Sire C, Duplomb S, Evrard C, Delord JP, Laguerre B, Zanetta S, Chevassus-Clément C, Fraslin A, Louat F, Sinigaglia L, Keilholz U, Bourhis J, Mesia R; GORTEC; AIO; TTCC, and UniCancer Head and Neck groups. Cetuximab, docetaxel, and cisplatin versus platinum, fluorouracil, and cetuximab as first-line treatment in patients with recurrent or metastatic head and neck squamous-cell carcinoma (GORTEC 2014-01 TPExtreme): a multicentre, open-label, randomised, phase 2 trial. Lancet Oncol. 2021 Apr;22(4):463-475. doi: 10.1016/S1470-2045(20)30755-5.
Disponível em https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1470-2045(20)30755-5
Hwang M, Seiwert TY. Are taxanes the future for head and neck cancer? Pragmatism in the immunotherapy era. Lancet Oncol. 2021 Apr;22(4):413-415. doi: 10.1016/S1470-2045(21)00121-2. Epub 2021 Mar 5. Erratum in: Lancet Oncol. 2021 Apr;22(4):e134.
Disponível em https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1470204521001212