Apesar de não estarem restritos a seu local de origem, o tratamento do câncer de cabeça e pescoço localmente avançado acontece com objetivo curativo.

Esse tipo de câncer corresponde a um estágio intermediário, entre os tumores diagnosticados e tratados em sua fase inicial e os que já fizeram metástase, se espalhando para outras regiões do organismo.
Apesar de não estarem restritos a seu local de origem, o tratamento do câncer de cabeça e pescoço localmente avançado acontece com objetivo curativo.
É sobre esse tema a entrevista com o presidente do GBCP, Dr. Thiago Bueno de Oliveira. Confira.
O que caracteriza um câncer de cabeça e pescoço localmente avançado?
A nomenclatura câncer de cabeça e pescoço localmente avançado refere-se a uma série de tipos de tumores que se originam nas vias aéreas digestivas superiores, como na cavidade oral, na orofaringe, na laringe, na hipofaringe. Esses cânceres apresentam um padrão de células semelhantes. Todos são carcinoma de células escamosas. Do ponto de vista de estadiamento, podemos dizer que correspondem a um estágio intermediário. Temos os tumores iniciais e no outro extremo os metastáticos, que já se espalharam. No meio desse caminho temos os localmente avançados, que não estão restritos a seu local de origem, já avançaram para as células dos gânglios, mas ainda não se disseminaram pelo corpo.
Como é o tratamento do câncer de cabeça e pescoço nesse estágio?
Em primeiro lugar, é importante dizer que o tratamento de um câncer de cabeça e pescoço localmente avançado é potencialmente curativo. Esses tumores exigem um tratamento multimodal, ou seja, mais de um tipo de intervenção terapêutica. É diferente de um tumor inicial que pode ser tratado, por exemplo, unicamente com uma cirurgia ou com uma radioterapia. No caso do câncer de cabeça e pescoço localmente avançados atuamos com a combinação de mais de uma estratégia de tratamento.
Quais são as possibilidades de estratégias?
Podemos dividir a estratégia terapêutica em dois grandes grupos: pacientes que vão ser tratados de maneira cirúrgica e aqueles que vão ser tratados de maneira não cirúrgica.
Quem são os pacientes do grupo cirúrgico?
Classicamente, os pacientes tratados de maneira cirúrgica são os que apresentam tumores primários da cavidade oral, que geralmente apresentam respostas piores ao tratamento radioterápico. Além disso, tumores mais avançados da região da laringe e da hipofaringe que já estão comprometendo a função desses órgãos. São casos que mesmo que aplicássemos a radioterapia e, com isso, eliminássemos o tumor, a função do órgão estaria comprometida, portanto é melhor operá-los. Depois da cirurgia, esses pacientes são tratados com radioterapia, combinada ou não com quimioterapia, a depender dos achados cirúrgicos.
E os pacientes do grupo não cirúrgico?
O grupo de pacientes tratado de maneira não cirúrgica, por sua vez, são submetidos à radioterapia, com intuito curativo. Essa opção terapêutica é possível porque temos algumas sub-localizações de orofaringe, laringe e hipofaringe, que podem apresentar tumores bastante sensíveis à radioterapia. São casos em que há chance de cura da doença com esse tipo de tratamento. Nesse cenário, temos a combinação de radioterapia e quimioterapia. Esses procedimentos podem ser aplicados de modo concomitante ou com um pouco de quimioterapia antes, a chamada quimioterapia de indução. Outra possibilidade é a combinação de radioterapia com terapia-alvo, no caso cetuximabe, para aqueles pacientes não elegíveis a receber quimioterapia baseada em cisplatina.
O que o médico observa para decidir o tratamento mais adequado para o paciente?
O primeiro ponto é o sítio primário da doença, ou seja, onde o tumor nasceu. Na cavidade oral, por exemplo, a tendência é tratar cirurgicamente, enquanto, tumores de orofaringe, é tratar de maneira não cirúrgica. Então, a localização inicial e o estágio da doença são critérios importantes. Por essa razão, a laringe e a hipofaringe, eu posso tratar de maneira não cirúrgica baseada em radioterapia, desde que doença não esteja em estágio muito avançado.
No caso de estágios muito avançados, a cirurgia passa a ser uma melhor opção. Além disso, precisamos considerar aspectos específicos do paciente. Se ele apresenta alguma comorbidade; tem condições de ser submetido a uma cirurgia; está apto a receber uma quimioterapia ou uma radioterapia. No caso da quimioterapia, há pacientes inelegíveis a cisplatina e a opção é o cetuximabe. Assim, há uma série de fatores a considerar, como idade, função renal, se há déficit auditivo, condição cardíaca. O protocolo de tratamento é personalizado, adequado a cada paciente.
Qual é o potencial de cura de um câncer de cabeça e pescoço localmente avançado? -
As taxas de cura variam de acordo com as características especificas, desde o estágio e localização primária da doença até as condições do paciente. Mas sabemos, por exemplo, que os tumores de orofaringe podem estar relacionados ao tabagismo ou ao Papilomavirus Humano (HPV).
Estudos mostram que a curabilidade do tumor de orofaringe relacionado ao HPV é maior do que de outros tumores dessa região, principalmente aos tabaco relacionados. Para cada cenário há uma estratégia de tratamento e as taxas de cura variam. Mas mesmo com todas essas variáveis, os tumores de cabeça e pescoço localmente avançados estão em um contexto de tratamento com objetivo curativo.
Em termos de estudos científicos desse tipo de câncer, qual é o cenário?
Há muitos estudos voltados a avaliar, por exemplo, novas drogas. Por exemplo, adicionando a imunoterapia ao tratamento baseado em radioterapia combinada à quimioterapia ou radioterapia combinada à cetuximabe. No entanto, os resultados foram negativos. Entre as possíveis justificativas está o fato da radioterapia nos tumores de cabeça, pescoço irradiar também a drenagem linfática, o que pode prejudicar uma resposta imune adequada induzida pela imunoterapia. Também há estudos com outras drogas radio sensibilizantes, mas que também não apresentaram resultados.
Então, por enquanto, as estratégias de tratamentos mais eficientes são as que tem como base a cirurgia, a radioterapia e a quimioterapia ou cetuximabe.
Além do médico cirurgião de cabeça e pescoço, que outros profissionais estão envolvidos no tratamento do paciente com câncer de cabeça e pescoço localmente avançado?
A decisão terapêutica, o tratamento e o acompanhamento desses pacientes são realizados em conjunto pelo cirurgião de cabeça e pescoço, oncologista clínico e o radioterapeuta. Além disso, igualmente importante são as especialidades não médicas, como a estomatologia, a fonoaudiologia, a nutrição, a fisioterapia, a psicologia.
Vale lembrar que a cirurgia ou a radioterapia na região da cabeça e pescoço, ou mesmo o tratamento sistêmico da quimioterapia, trazem efeitos colaterais ou até mesmo sequelas, como problemas de fala, dificuldade de deglutição, perda de paladar, lesões na boca originadas da radiação, entre outras, que precisam de tratamento ou reabilitação. Portanto, a atuação desses profissionais é muito bem-vinda.
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