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O que ainda é preciso melhorar no enfrentamento do câncer de boca no Brasil?

Conscientizar sobre sinais e sintomas desse tipo de câncer, tanto os pacientes como as equipes de saúde que os atendem, para que estejam alertas à possibilidade da doença é fundamental. Além disso, igualmente importante é melhorar o acesso da população à atenção terciária, onde está posicionado o cirurgião de cabeça e pescoço. Essas são as principais medidas, na opinião do Dr. Alexandre de Andrade Sousa, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e membro do Grupo Brasileira de Câncer de Cabeça e Pescoço (GBCP) e da Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço (SBCCP).


A pergunta "o que é preciso melhorar no enfrentamento do câncer de boca no Brasil" e a imagem do médico que explica o assunto

O câncer da boca, também denominado câncer da cavidade oral, é um tumor maligno que pode acometer os lábios e as estruturas da boca, como gengivas, bochechas, céu da boca (palato), língua e a região embaixo da língua (assoalho da boca). “É um câncer evitável e que se descoberto e tratado no início tem altas chances de cura”, afirma o cirurgião.


No entanto, o cenário da doença no Brasil não reflete as características citadas pelo especialista em relação à prevenção e ao sucesso de tratamento da doença. Pelo contrário, Sousa explica que, infelizmente, cerca de 90% dos casos são diagnosticados em estágio já avançado, o que significa que mesmo que o paciente sobreviva à doença, terá que lidar com mais morbidades em seu tratamento e conviver com sequelas, que podem afetar, além da autoimagem, funcionalidades importantes dessa região do organismo, como a fala, a alimentação, a visão, entre muitas outras. “A cabeça e pescoço, embora seja uma região pequena, é uma área altamente funcional, que tem várias estruturas importantíssimas para o corpo”, reforça.


A avaliação do professor da UFMG encontra eco nas estimativas do Instituto Nacional do Câncer (INCA) referentes ao câncer de boca. São cerca de 15 mil novos casos por ano de câncer de boca, a maioria descoberta em estágio avançado, o que contribui para aumentar o número de óbitos pela doença. Dados do Atlas de Mortalidade por Câncer/Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) apontam cerca de 6 mil mortes por câncer de boca, em 2020.


Para fazer frente a esse cenário é fundamental conscientizar sobre os fatores de risco com vistas à prevenção da doença e à importância de estar atento a sinais que podem levar a um diagnóstico precoce, aumentando as chances de cura e diminuindo a morbidade do tratamento. São comportamentos que devem ser adotados sempre, mas, especialmente no mês de maio, há uma campanha dedicada a reforçar essas medidas: o Maio Vermelho.


Segundo Sousa, o principal tipo de câncer que acomete a região da cabeça e pescoço é o carcinoma espinocelular (95% dos casos). “Podemos evitar esse tipo de câncer não nos expondo a seus principais fatores de risco que são o tabagismo e o excesso de consumo de bebidas alcoólica”, diz.


Outro fator de risco importante para o câncer de boca e também para o de orofaringe é o Papilomavírus humano (HPV), transmitido por via sexual, que pode ser prevenido com a vacina disponível gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS) para crianças, entre 9 e 14 anos, e adolescentes, entre 15 e 19 anos, além de outras situações específicas. “O imunizante é extremamente eficaz e também está na rede privada. Para os que estão fora da faixa etária contemplada no SUS e têm condições de arcar com os custos, acho que vale a pena investir nessa vacina”, afirma.


Outra medida fundamental para reverter o cenário do câncer de cabeça e pescoço no país, na opinião de Sousa, é o conhecimento e a não banalização de sinais e sintomas de alerta para um possível câncer de boca. Isso vale para as pessoas e para os profissionais de saúde que nem sempre consideram essa hipótese diante da queixa ou exame clínico de um paciente. Entre eles estão:


•⁠ ⁠Feridas ou úlceras que não cicatrizam por mais de duas semanas;

•⁠ ⁠Manchas vermelhas ou brancas na mucosa bucal;

•⁠ ⁠Dor persistente na boca ou na garganta;

•⁠ Dificuldade ou dor ao mastigar, engolir ou falar;

•⁠ Inchaço ou nódulos na região da boca, lábios ou pescoço;

•⁠ ⁠Perda de peso sem motivo aparente;

•⁠ ⁠Sensação de algo preso na garganta ou na boca;

•⁠ ⁠Alterações na voz ou sensação de formigamento na boca ou lábios;

•⁠ ⁠Dente que fica mole, sem uma causa aparente;

•⁠ ⁠Gengivite e sangramentos na boca.

 

“São sinais que não necessariamente são de um câncer de boca, mas que, sem dúvida, merecem investigação. Pode ser uma inflamação, uma cárie ou um espinho de peixe preso na garganta. O melhor é não arriscar e procurar avaliação médica”, recomenda.


Um dos grandes parceiros no diagnóstico do câncer de boca é o dentista, afirma Sousa. Por essa razão, é muito importante que esse profissional tenha conhecimentos, mesmo que gerais, sobre câncer, para que possa em sua prática, considerar essa hipótese e encaminhar o paciente para uma avaliação oncológica, quando achar necessário. “Além do dentistas, muitas outras especialidades e profissionais de saúde podem contribuir para o diagnóstico precoce de um câncer de boca, entre outras doenças oncológicas, no contato com seu paciente. O importante é ficar atento e não deixar passar essa possibilidade”, diz.


Mas de nada adianta estar alerta aos sinais de um possível câncer de boca, se o paciente não tiver acesso rápido a recursos que podem confirmar ou excluir esse diagnóstico e, em caso afirmativo, começar imediatamente o tratamento. Esse ainda é um dos grandes desafios da saúde pública, opção para a maioria dos brasileiros que não podem arcar com os custos da saúde privada. “Costumo destacar para meus alunos de medicina da UFMG que entre as causas de atraso no diagnóstico do câncer, além do desconhecimento do paciente sobre prevenção, sinais e sintomas e o despreparo dos profissionais de saúde em geral sobre doenças oncológicas, está a desigualdade da logística em relação aos acesso aos serviços de saúde. Sem dúvida, quanto mais afastado de grandes centros e capitais o paciente se encontra, mais longa é a espera para chegar à atenção terciária, onde está o cirurgião de cabeça e pescoço”, avalia.

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